A ponteira norte-americana Deja McClendon, 28 anos, que defendeu o Itambé/Minas durante parte da temporada 2019/2020, deu uma entrevista muito sensível ao site da Athletes Unlimited, que vai organizar, em fevereiro, a primeira Liga Profissional Feminina de Vôlei nos EUA – e da qual ela vai participar. Deja falou sobre a alopecia, doença autoimune e inflamatória que provoca a queda do cabelo e citou o caso de uma garotinha no Brasil que a inspirou a ser exemplo a outras pessoas com a mesma doença no mundo.
Duas vezes campeã da NCAA (a Liga Universitária norte-americana), com a Penn State, ela já atuou em países como Polônia, Azerbaijão, Itália, Brasil e agora faz parte do time Athletes Unlimited, nos Estados Unidos. No ano passado, houve um fato na sua vida que a marcou: ela ficou careca. E ela o fez com ousadia e orgulho.
McClendon tem Alopecia desde os 12 anos. Isso significava ter manchas do tamanho de uma moeda de dez centavos em seu couro cabeludo, que contrastavam com os cabelos longos. Em 2019, ela tomou uma decisão que mudaria sua vida: interromper todos os tratamentos, raspar a cabeça e ficar careca.
– Existem diferentes estágios disso. Eu tive um estágio leve chamado alopecia areata, onde você só perde áreas de cabelo pequenas, do tamanho de um centavo de dólar. Eu estava recebendo tratamento desde os 12 anos, que consistia basicamente em injeções de esteróides, muitas pequenas injeções naquela área. E então bloqueará seu sistema imunológico e seu cabelo começará a crescer novamente – disse a jogadora.
– Assim que cheguei à Itália, há alguns anos, disse a eles que tinha essa condição e é assim que a trato e este é o medicamento que uso. Eles deveriam enviar essa papelada e levá-la ao governo para que a federação pudesse aprová-la para que eu continuasse a tomar meus medicamentos enquanto jogava. Mas, tudo estava tão lento e havia tantas desconexões que simplesmente não funcionou. Levaram cinco meses para aprovar meu medicamento. E nesses cinco meses, uma pequena mancha havia se transformado em toda a parte de trás da minha cabeça. Eu ainda estava escondendo e continuando minha vida e ainda fazendo tudo normalmente. E eu ficava pensando o tempo todo,‘ E se isso aparecer durante as partidas? ’Eu estava ficando muito constrangida. Eu não me sentia como eu. Eu não me sentia mulher. Isso é como um estigma criado com o cabelo, para uma mulher – contou.
Para McClendon, o estresse não valeu a pena.
– Cheguei a um ponto em que acho que era véspera de Ano Novo e eu estava sentada pensando em mim mesmo, pensando em mim. Eu estava tipo, ‘O que é mesmo cabelo? O que é isso? Não é nada. No grande esquema das coisas, não é nada. ‘Eu pensei sobre quem eu sou como pessoa. Eu estava tipo, ‘Quer saber? Eu me coloquei nesta caixinha de quem eu sou, e isso não sou eu. Se eu cortar todo o meu cabelo amanhã, ainda sou eu. Eu ainda estou saudável. Ainda tenho uma ótima família e um ótimo sistema de apoio – disse.
McClendon baseou-se na força da família e do hoje noivo para tomar a decisão de ficar careca ser um pouco mais fácil:
– No começo liguei para minha irmã e pensei,‘ Ei, o que você faria se eu raspasse minha cabeça? O que você acha? ‘. E ela disse,‘ Bem, vou raspar minha cabeça também ’. Então liguei para minha mãe. Eu estava tipo, ‘Ei, mãe, como você acha que eu ficaria careca se raspasse a cabeça?’ Ela estava tipo, ‘Faça isso e você será uma modelo. Você pode fazer o que quiser. ‘Então liguei para meu namorado, meu agora noivo. Eu disse, ‘Niko, o que você faria se eu raspasse minha cabeça?’ Ele estava tipo, ‘Oh, eu raspo para você’ – relembrou a jogadora.
– Depois disso, percebi que essas são algumas das pessoas mais importantes da minha vida e que me apoiam. Isso é o que importa. As opiniões deles são as únicas que realmente importam. Naquele ponto, isso estava definido em minha mente. Eu sabia que ia fazer isso. Muito disso tinha menos a ver com a alopecia e mais com eu querer me livrar dessa caixa de expectativas em que me coloquei e dessa ideia de um padrão de beleza que todos nós meio que seguimos muitas vezes sem sabendo disso.
Na mente de McClendon, não havia dúvida de que ela tinha feito a coisa certa.
– No momento em que fiz isso, fiquei muito livre e me senti muito feliz. E eu me senti verdadeiramente eu pela primeira vez. Estou muito, muito feliz por ter feito isso. Eu não tenho nenhum arrependimento. Eu poderia ter deixado meu cabelo crescer. Eu poderia realmente ter continuado nessa luta, mas eu realmente senti que não sou quem eu sou. Não é quem eu quero ser. Essa não é a mensagem que eu quero transmitir. A partir daquele momento, eu senti que poderia ser muito mais aberta sobre a luta e poderia compartilhar isso com outras pessoas e outras meninas também, porque eu acho que se eu lutasse com isso desde os 12 anos, eu sabia que provavelmente havia outros garotas lutando com a mesma coisa – contou.
As reações à decisão de McClendon de raspar a cabeça foram extremamente positivas. Mas havia algumas perguntas que ela precisava responder.
– As primeiras reações, na verdade, vieram de pessoas no Instagram … Acho que muitas pessoas simplesmente assumem imediatamente que você está doente se raspar a cabeça do nada. Eles ficam tipo, ‘Você está bem? Você tem câncer? O que você está passando? “E então há pessoas que pensaram que eu tive um ‘momento Britney’, onde você tem crises mentais e você fica tipo, ‘Ok, vou raspar minha cabeça’, como se você não tivesse pensado nisso ou não planejou. Então é isso. Então você consegue as pessoas que têm um apoio imenso. Eles ficam tipo, ‘Oh, meu Deus, isso é incrível. Você é tão ousada. Você é tão corajosa ’e todas essas outras reações muito positivas. Todos eles eu posso entender. Contei minha história às pessoas sobre isso e fiquei muito grata por todo o apoio. Mas também, percebi que é só sobre mim. Se eu gosto e amo, então a opinião de qualquer outra pessoa não importa de verdade.
O Brasil trouxe mais reações, quando ela veio defender o Itambé/Minas na temporada 2019/2020:
– Minhas companheiras de equipe no Brasil me deram muito, muito apoio. Elas não me conheciam, então não acho que foi um grande choque para eles me verem sem cabelo. Os fãs apoiaram muito meu penteado. Eu era a única jogadora careca lá, então acho isso muito legal. No Brasil, havia uma jovem chamada Giovanna Campos, e o pai dela me mandou uma mensagem no Instagram. Acho que eles me viram jogar na TV. Giovanna tem alopecia. Ela tem 7 anos. O pai dela me mandou uma mensagem e disse: ‘Estamos muito felizes em vê-lo na TV. Giovanna tem alopecia universalis, então ela é completamente careca, e foi incrível para nós ver você, e esperamos vê-lo pessoalmente – contou Deja.
– A temporada foi cancelada antes que eu pudesse encontrar com ela pessoalmente, mas eu mandei uma mensagem de volta. Eu queria dizer a ela que ela foi uma grande inspiração para mim porque ela é tão bonita e tão aberta e tão honesta sobre sua alopecia. Ela não esconde isso, e ela é tão livre com isso em uma idade tão jovem. Acho que ela foi uma das razões pelas quais eu senti que também poderia trazer mais informações sobre como falar sobre alopecia e consciência da alopecia. Ela foi uma inspiração para mim. Ela me fez sentir como se houvesse um propósito maior no que eu estava fazendo. Eu só estava jogando vôlei. Eu nem estava pensando no meu cabelo. Isso realmente me acordou um pouco – disse a ponteira.
McClendon terá a chance de continuar inspirando quando a temporada de vôlei do Athletes Unlimited começar em fevereiro. Seu plano imediato é viajar para a Polônia para ficar e treinar com Niko, que é fisioterapeuta.
– Estou muito, muito animada por fazer parte da Athletes Unlimited. Acho que muito disso foi que tivemos a oportunidade de criar algo aqui nos Estados Unidos porque não temos nenhuma liga aqui e, como a maioria das meninas que estão jogando, jogamos vários anos no exterior. Então, ter essa oportunidade de jogar entre nossa família e amigos é simplesmente incrível – completou.