Quando Nelson Rodrigues criou, mais de 60 anos atrás, a expressão “complexo de vira-latas” para definir a posição de inferioridade e de autodepreciação que muitos brasileiros sofrem, ele acertou na mosca. Infelizmente o sentimento existe e parece crescer com o passar do tempo. Hoje eu preciso resgatá-lo para escrever sobre Gabi.
A camisa 10 virou capitã da Seleção Brasileira feminina de vôlei neste ciclo olímpico. Quase no mesmo período de sua eleição como a melhor jogadora da Champions League, uma das principais competições do mundo. Praticamente no mesmo período de ter conquistado todos os títulos possíveis com o Vakifbank, sempre sendo protagonista. Feitos enormes para qualquer atleta, de qualquer nacionalidade, convenhamos.
Ter chegado a tal status, para alguns brasileiros, significa que Gabi precisa fazer 35 pontos por jogo, não pode errar nenhum ataque e deve ser substituída se errar um passe. “Cadê a MVP?”, “já passou da hora de ir pro banco de reservas” e “não é tudo isso” são frases escritas na caixa de comentários de transmissões do Web Vôlei neste Mundial e endereçadas para Gabi. É a comprovação de que Nelson Rodrigues tinha total razão. E os números da primeira fase do Campeonato Mundial ajudam a ratificar a tese do nosso vira-latismo.
Gabi fez, em cinco jogos, 87 pontos. A maior pontuadora do Brasil tem exatamente a mesma pontuação da Paola Egonu. Na eficiência do fundamento, a italiana é ligeiramente melhor: 49% a 48%. Deixo esse primeiro argumento para a reflexão dos haters.
Vamos ao segundo: no passe, Gabi tem mais de 40% de perfeição. Ao refinar a análise e colocar atletas com mais de 90 ações no fundamento nesre Mundial, a brasileira fica em terceiro lugar no geral.
Quer mais? A melhor defensora do Brasil na competição também é ela. Ocupa o oitavo lugar entre todas as jogadoras. Excluindo as líberos da lista, Gabi ocuparia a terceira colocação.
Para quem ainda não entendeu, o Brasil tem hoje, sim, uma das melhores jogadoras do mundo. Queiram ou não os vira-latas de plantão!
Por Daniel Bortoletto